WhatsApp no Tribunal: A utilização de prova digital no processo civil

O "Contencioso em Foco" é uma rubrica Caiado Guerreiro, que conta com a participação da partner Sandra Ferreira Dias — co-coordenadora da equipa de Contencioso e Arbitragem —, da advogada Inês Camilo de Azevedo e da advogada-estagiária Beatriz Pires Costa, onde são esclarecidas dúvidas e questões desta área do Direito. O tema desta semana é a utilização de prova digital no processo civil.
Artigos 18/09/2025

Atualmente, por força da revolução tecnológica que marcou o último século, a forma como as pessoas se relacionam mudou profundamente. Uma informação que antes era partilhada através de uma carta ou por fax, é hoje enviada através de um email ou de um chat de uma rede social, como o WhatsApp.

Esta mudança não se circunscreveu apenas ao plano social, tendo passado a fazer parte das relações profissionais e da atividade das empresas, com impacto e reflexo imediatos no sistema legal, mais propriamente no processo civil, onde se passou a utilizar a prova digital como meio de prova.

A prova digital, de forma geral, será aquela que seja produzida digitalmente e cujo respetivo armazenamento ou transmissão ocorra por meio de dispositivos informáticos.

Esta prova pode encontrar-se integrada, entre outros meios, em fotografias, emails e printscreens. Neste sentido, as mensagens trocadas entre duas pessoas através da aplicação WhatsApp podem ser apresentadas junto do processo, quando a sua relevância assim o justifique, através da apresentação de um printscreen à própria conversa como também através de uma perícia técnica ao telemóvel da parte que apresentou a respetiva prova.

(Infelizmente) não existe ainda legislação nacional que consagre um regime próprio para a utilização de provas digitais no processo civil, não obstante, existem diplomas que representam pontos de partida para a sua aplicação legal.

No que diz respeito ao valor probatório da prova digital, este irá variar atendendo ao tipo de prova digital em apreço.

Tratando-se de um documento eletrónico há que atender ao Regulamento (EU) n. º 910/2014 que coordena esta matéria. A força probatória de um documento eletrónico, i.e., a aptidão de um meio de prova de convencer o juiz sobre a veracidade dos factos que representa, varia conforme a tipologia de assinatura digital aposta ao mesmo.

A assinatura eletrónica, enquanto mecanismo de autenticação de um documento eletrónico, subdivide-se em duas grandes tipologias: a assinatura simples e a assinatura avançada ou qualificada.

No que diz respeito aos demais meios de prova digital que não encontram base legal que oriente a sua força probatória concreta, estes encontrar-se-ão sujeitos ao princípio geral da livre apreciação da prova por parte do juiz.

A principal dificuldade levantada pelas provas digitais prende-se com a sua autenticidade e a ameaça que as novas tecnologias, nomeadamente com recurso a ferramentas de inteligência artificial, representam para a mesma.

A autenticidade é fundamental no que diz respeito à utilização de provas digitais, uma vez que atualmente o advento das ferramentas digitais e da inteligência artificial tem propiciado casos de manipulação, quer na sua origem (Deepfake), quer na sua transmissão (Photoshop).

O desenvolvimento destas ferramentas tem vindo a aperfeiçoar essas manipulações, tornando cada vez mais complexa a identificação de uma deturpação na prova digital.

Estes tipos de ferramentas concretizam verdadeiras fontes de desinformação quando utilizadas com vista à manipulação da convicção de terceiro e podem apresentar-se como verdadeiros obstáculos à descoberta da verdade.

A prova digital é uma realidade processual que veio para ficar, consagrando um reflexo da crescente digitalização das relações pessoais e profissionais.

Os julgadores são frequentemente confrontados, e irão ser cada vez mais, com dificuldades inerentes a este tipo de prova, nomeadamente no que diz respeito à garantia da sua autenticidade.

O desafio que encaramos é o do desenvolvimento de critérios e meios no ordenamento jurídico português que assegurem a devida adaptação a esta modernização do direito probatório, sob pena de se tornar obsoleto face à proliferação da prova digital.


O conteúdo desta informação não constitui aconselhamento jurídico e não deve ser invocado nesse sentido. Aconselhamento específico deve ser procurado sobre as circunstâncias concretas do caso. Se tiver alguma dúvida sobre uma questão de direito Português, não hesite em contactar-nos.

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