A Proposta do Orçamento do Estado 2026 inclui um conjunto de alterações fiscais destinadas a aliviar a carga sobre famílias e empresas, promover o investimento e ajustar o sistema tributário às necessidades atuais. Este artigo foca-se exclusivamente nas medidas fiscais e legislativas, explicando as mudanças no IRS, no IRC, nos impostos sobre consumo e nas regras de tributação imobiliária.
1. Alterações ao IRS (Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares)
Alteração dos escalões do IRS
Uma das principais medidas do OE2026 é a redução das taxas marginais do IRS – a proposta legislativa corta 0,3 pontos percentuais às taxas do 2.º ao 5.º escalão do IRS. Esta redução procura conceder um alívio fiscal à classe média e aos agregados familiares de rendimentos intermédios, reforçando o rendimento disponível e incentivando o consumo interno.
Actualização do mínimo de existência
Outra modificação legislativa relevante é a atualização do mínimo de existência, que constitui o limiar de rendimento a partir do qual não há lugar ao pagamento de imposto. O valor passa a corresponder ao maior entre 12 880 € e 1,5 × 14 × IAS. Na prática, isto garante que quem aufere o salário mínimo nacional – de 920 € em 2026 – está totalmente isento de IRS.
Esta alteração pretende proteger os trabalhadores com rendimentos mais baixos e simplificar o cálculo do imposto, à semelhança do ocorrido em anos anteriores.
Ajuste das tabelas de retenção na fonte
O Ministro das Finanças assegurou que a redução das taxas do IRS será refletida nas tabelas de retenção a partir de janeiro de 2026. A medida prevê que a retenção mensal se aproxime do imposto devido, reduzindo a necessidade de acertos posteriores e facilitando a gestão financeira dos contribuintes ao longo do ano.
Este ajuste legislativo reforça a transparência do sistema e tendencialmente diminui os reembolsos ou pagamentos adicionais no momento da liquidação.
De forma simples, o contribuinte emprestará menos dinheiro ao Estado ao longo do ano e vice-versa.
Manutenção da isenção para prémios de produtividade
O OE2026 mantém a isenção fiscal e contributiva para prémios de produtividade até 6 % da remuneração anual. Esta medida visa incentivar as empresas a recompensarem o desempenho dos colaboradores, sem penalização fiscal, estimulando a produtividade e a competitividade.
Embora se trate de uma prorrogação, o enquadramento legal reforça o estímulo à meritocracia e constitui uma componente importante da política fiscal laboral.
2. Reforma do IRC (Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas)
Descida gradual da taxa de IRC
No que toca ao IRC, o orçamento para 2026 estabelece uma redução da taxa nominal de 1 ponto percentual, fixando-a em 19 %. As pequenas e médias empresas (PME) beneficiarão de uma taxa reduzida de 15 % nos primeiros 50 000 € de matéria coletável.
Esta estratégia integra uma meta de diminuição progressiva, que visa atingir 17 % até 2028, criando um ambiente mais favorável ao investimento e ao crescimento empresarial.
Revisão da tributação sobre a banca e contribuições extraordinárias
Na sequência da declaração de inconstitucionalidade, o OE2026 revoga a Contribuição de Solidariedade do Setor Bancário. A proposta indica que a tributação do sector será revista em 2026, para assegurar justiça fiscal e competitividade.
Adicionalmente, o CESE (Contribuição Extraordinária sobre o Setor Energético) para o gás natural também é revogado, mantendo-se apenas para outros operadores energéticos.
É mantida a CEIF (Contribuição Especial sobre a Indústria Farmacêutica).
Estas decisões legislativas demonstram a intenção de alinhar a fiscalidade do sector financeiro com os princípios constitucionais, ao mesmo tempo que preservam receitas essenciais para o erário público através de novos modelos contributivos ainda a definir.
3. Impostos sobre o consumo
Combustíveis e ISP
Embora o Imposto sobre os Produtos Petrolíferos (ISP) mantenha as taxas habituais, o OE2026 prevê a eliminação gradual do desconto extraordinário aplicado em 2022 e 2023, à medida que os preços internacionais da energia baixem.
A receita do ISP deverá aumentar 4,6 %, refletindo uma subida do consumo e a redução de bonificações. Esta política pretende equilibrar a necessidade de receita com a proteção dos consumidores, mantendo a competitividade do preço dos combustíveis face a outros países da União Europeia.
IUC e ISV: receitas em alta, taxas constantes
O Imposto Único de Circulação (IUC) e o Imposto Sobre Veículos (ISV) não sofrerão alterações nas tabelas ou escalões. No entanto, as receitas previstas aumentam. O acréscimo resulta da renovação do parque automóvel e do crescimento das vendas de veículos, bem como da indexação das taxas à inflação.
Para os contribuintes, manter as taxas inalteradas proporciona estabilidade e previsibilidade, embora o impacto no orçamento das famílias dependa do perfil de consumo.
IABA, tabaco e nicotina
No âmbito do Imposto sobre o Álcool, Bebidas Alcoólicas e Bebidas Não Alcoólicas (IABA), as taxas permanecem inalteradas, mas a receita global estimada aumenta, alcançando 317 M€ (+2,5 %). A maior variação ocorre no imposto sobre o tabaco, que deverá gerar 1,676 mil milhões de euros, um crescimento de 4,4 %. Destaque também para a criação de uma tributação sobre pastilhas de nicotina à taxa de 6,5 cêntimos por grama, que visa equiparar estes produtos a outros derivados do tabaco, tanto por razões de saúde pública como por justiça fiscal.
Manutenção do IVA e do imposto do selo
O orçamento não altera as taxas de IVA, mas prevê um crescimento das receitas em 5,1 %, alcançando 27,489 mil milhões de euros, refletindo uma economia em expansão e uma maior eficiência na cobrança. O Imposto do Selo também permanece com as taxas atuais, projetando uma receita de 2,458 mil milhões de euros. Por não alterarem a legislação, estas previsões confirmam a intenção do Governo de estabilizar a carga tributária indireta, protegendo o consumo e a competitividade interna.
4. Tributação imobiliária e habitação
IMT Jovem e incentivo à primeira habitação
O IMT Jovem, imposto sobre a compra de imóveis, é atualizado para acompanhar a valorização do mercado. A isenção na aquisição de primeira habitação passa a aplicar-se a imóveis até 330 500 €, e a taxa de 8 % incide sobre a fração seguinte até 660 982 €.
Esta medida legislativa visa facilitar o acesso à habitação por jovens e famílias de primeira compra, compensando o aumento dos preços e promovendo a mobilidade residencial, procurando (de forma insuficiente) acompanhar uma subida do preço da habitação.
Atualização das rendas e deduções no IRS
O Governo autoriza que as rendas habitacionais sejam atualizadas até 2,24 % em 2026, assegurando um equilíbrio entre a proteção dos inquilinos e o direito dos proprietários a acompanhar a inflação.
Além disso, o OE2026 prevê uma maior dedução de IRS nas rendas moderadas e uma redução da taxa de IRS aplicada a esses rendimentos de 25 % para 10 %. Com estas medidas, o executivo pretende estimular a oferta de arrendamento acessível e reduzir a carga fiscal para senhorios que pratiquem preços abaixo do mercado.
A política complementa-se com a eliminação do imposto sobre mais-valias nas vendas de imóveis reinvestidas em arrendamento acessível.
Benefícios fiscais à habitação de preços moderados
No intuito de aumentar a oferta de habitação, o orçamento aplica uma taxa de IVA reduzida de 6 % à construção de casas com preços controlados. Esta medida procura diminuir o custo de produção e incentivar promotores e cooperativas a investirem em projetos acessíveis. Aliada aos incentivos em sede de IRS, IMT e IMI, cria-se um quadro fiscal favorável para o arrendamento acessível e para a construção de habitação a preços moderados.
5. Outras medidas fiscais relevantes
Fiscalidade ambiental e transição energética
Embora não implique alterações imediatas às taxas, o OE2026 introduz instrumentos ligados à fiscalidade ambiental, como o Plano Social do Clima e o reforço do Fundo Ambiental, que apoiam projetos de descarbonização e eficiência energética. A política fiscal inclui incentivos à mobilidade sustentável e à economia circular, contribuindo para cumprir as metas de neutralidade climática. Alguns instrumentos poderão, no futuro, traduzir-se em benefícios fiscais para quem adote práticas verdes (como reduções do IVA em equipamentos sustentáveis ou deduções em IRS por investimentos em energias renováveis), embora ainda não especificados na legislação aprovada.
Simplificação e transparência fiscal
Finalmente, o Governo compromete-se a simplificar o sistema fiscal através da orçamentação por programas e da eliminação de normas não orçamentais do texto do orçamento. Essa reforma não altera diretamente as taxas ou os impostos, mas torna mais claro o impacto de cada medida legislativa e facilita o acompanhamento pelos cidadãos. A modernização do processo orçamental deve reduzir a incerteza jurídica e tornar a administração fiscal mais eficiente, incentivando o cumprimento voluntário das obrigações tributárias.
Uma reflexão
As medidas legislativas fiscais da proposta do Orçamento do Estado para 2026 (OE2026) revelam uma intenção declarada do Governo em reduzir a carga fiscal sobre famílias e empresas, promover o investimento e estabilizar a tributação indireta. A descida das taxas de IRS e de IRC, a atualização do mínimo de existência e os incentivos ao arrendamento acessível são apresentadas como instrumentos de reforço do rendimento disponível e de estímulo à atividade económica.
Contudo, num contexto de inflação persistente e de subida acentuada dos preços da habitação, estas medidas poderão ser insuficientes para produzir um impacto real na vida das famílias portuguesas.
Em síntese, embora o orçamento procure, pela via fiscal, fomentar o crescimento económico e reforçar a competitividade, o seu alcance prático permanece modesto e desajustado à realidade económica das famílias portuguesas.
O sucesso destas políticas dependerá menos da engenharia legislativa e mais da capacidade do Governo em restaurar a confiança e responder às pressões sociais com medidas eficazes e estruturais.
O conteúdo desta informação não constitui aconselhamento jurídico e não deve ser invocado nesse sentido. Aconselhamento específico deve ser procurado sobre as circunstâncias concretas do caso. Se tiver alguma dúvida sobre uma questão de direito Português, não hesite em contactar-nos.