Dispensa de Depósito de Custas de Parte – Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 269/2025

O "Contencioso em Foco" é uma rubrica Caiado Guerreiro, que conta com a participação da partner Sandra Ferreira Dias — co-coordenadora da equipa de Contencioso e Arbitragem —, da advogada Inês de Azevedo Camilo e da jurista Olga Stelmashchuk, onde são esclarecidas dúvidas e questões desta área do Direito. O tema desta semana é a "Dispensa de Depósito de Custas de Parte – Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 269".
Artigos 05/06/2025

O Tribunal Constitucional declarou recentemente no seu Acórdão n.º 269/2025, de 5 de maio, a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, de uma interpretação restritiva da norma constante do n.º 2 do artigo 26.º-A do Regulamento das Custas Processuais.

Em causa estava a regra segundo a qual, para reclamar dos valores apresentados na nota discriminativa e justificativa de custas de parte, a parte vencida teria sempre de depositar, no prazo de 10 dias, de forma integral e antecipada, o montante exigido — mesmo que este fosse excessivamente oneroso ou discricionário.

No âmbito deste processo de fiscalização da constitucionalidade não se colocava em causa a exigência do depósito integral das notas justificativas — que já viu a respetiva conformidade constitucional reafirmada por diversas vezes – mas sim a inexistência da faculdade de o juiz poder dispensar o depósito integral deste montante, em casos de manifesta desproporção.

Se é certo que o depósito integral do valor das custas reclamadas prossegue um fim juridicamente admissível – por um lado garantir que o custeamento do processo corra efetivamente por conta de quem lhe deu causa e, por outro lado, moderar o regime processual de reclamações e recursos, de forma a evitar o seu uso dilatório – também é verdade que esta exigência pode tornar-se numa barreira económica desproporcional, especialmente se os valores forem excessivos, infundados ou imprevisíveis.

O Tribunal Constitucional entendeu que esta obrigação definida de forma absoluta, sem permitir ao juiz qualquer margem de apreciação das circunstâncias do caso concreto, viola o direito de acesso à justiça e aos tribunais e o princípio da proporcionalidade constitucionalmente consagrados.

Ainda que seja legítimo ao Estado exigir encargos pelo funcionamento da justiça — seja a título de depósito prévio ou de obrigação de pagamento — não se podem criar obstáculos que, na prática, inviabilizem ou tornem particularmente oneroso o exercício desse direito.

Com esta decisão, fica agora claro que o juiz pode — e deve — numa espécie de controlo interno – avaliar a razoabilidade do montante exigido antes de condicionar a reclamação ao depósito integral. Trata-se de uma vitória rumo a uma justiça acessível e equilibrada, que protege os cidadãos contra exigências arbitrárias e assegura maior controlo judicial sobre eventuais abusos.

Este acórdão reafirma, assim, um princípio fundamental do Estado de direito: a justiça não pode ser um privilégio de quem pode pagar por ela.


O conteúdo desta informação não constitui aconselhamento jurídico e não deve ser invocado nesse sentido. Aconselhamento específico deve ser procurado sobre as circunstâncias concretas do caso. Se tiver alguma dúvida sobre uma questão de direito Português, não hesite em contactar-nos.

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