De acordo com o programa do atual Governo, o combate à corrupção surge como um dos seus objetivos fundamentais, materializado na Estratégia Nacional Anticorrupção 2020-2024.
As propostas de leis dirigidas a operacionalizar esta Estratégia instituem um conjunto de alterações ao Código Penal, ao Código de Processo Penal e a legislação conexa, com o intuito último de reforçar o quadro repressivo da corrupção, bem como da criminalidade afim.
Uma das leis que veio aprovar as medidas previstas no referido plano estratégico foi a Lei n.º 94/2021, de 21 de dezembro, que reconfigurou soluções que já existiam. Em particular, veio alterar o artigo 374.º – B do Código Penal (Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de março). Disposição esta que é replicada no artigo 19.º – A, especificando o preceituado aos crimes da responsabilidade de titulares de cargos políticos (Lei n.º 34/87, de 16 de julho).
O artigo 374.º – B do Código Penal, sob a epígrafe “dispensa ou atenuação de pena”, vem definir as situações em que, verificando-se um contributo probatório de alguém que é suspeito ou arguido da prática de um crime, o mesmo – mediante a verificação de certos requisitos legais – vem a ser premiado por ter contribuído para a descoberta da verdade. Estamos, então, perante os denominados mecanismos premiais enquanto meio de combate à corrupção.
Esta colaboração premiada tem a sua razão de ser em vários fundamentos, uns com maior reflexo na prática da corrupção que se verifica em Portugal, e nos quais se destacam o facto de a colaboração premiada consistir num elemento facilitador do sistema de prova; elemento este que pode dissuadir à prática destes crimes, por se saber que outrem poderá ser beneficiado se vier a denunciar a prática dos mesmos e os seus agentes; e por permitir alcançar a tutela da paz pública por meio da diminuição da perigosidade de certo grupo de pessoas.
Desta forma, após as alterações legislativas referidas, o artigo em causa vem prever casos de dispensa de pena obrigatória (n.º 1), de dispensa de pena facultativa (n.º 2) e de atenuação especial da pena obrigatória (n.º 5).
Nos termos do n.º 1, o agente é dispensado de pena, mediante a verificação de outros pressupostos, sempre que tiver denunciado o crime antes da instauração de procedimento criminal. O que está em causa nesta hipótese é, portanto, uma neutralização do desvalor que o crime de corrupção envolveu.
Já nos termos do n.º 2, prevê-se que o agente pode ser dispensado de pena sempre que, mediante a verificação de outras condições, durante o inquérito ou a instrução tiver contribuído decisivamente para a descoberta da verdade.
Por fim, o n.º 5 prevê que a pena é especialmente atenuada se, até ao encerramento da audiência de julgamento em primeira instância, o agente colaborar ativamente na descoberta da verdade, contribuindo de forma relevante para a prova dos factos.
Assim, o que estas regulações no contexto premial visam abarcar são situações em que o agente não só se autoincrimina, como também incrimina terceiros. São casos em que o agente presta à Justiça uma colaboração total, fiel e verdadeira. Só assim se poderá considerar que estão reunidas as circunstâncias que a lei exige para que haja lugar à dispensa ou à atenuação especial da pena de um arguido que, nomeadamente, praticou um crime de corrupção.
Não obstante o artigo 374.º – B do Código Penal prever até soluções premiais obrigatórias, verificadas que estejam as condições legais enunciadas, o que se tem vindo a verificar no Processo Penal Português é uma renitência na sua aplicação que poderá levar a que este mecanismo de combate à corrupção não comporte os efeitos expectados.
O conteúdo desta informação não constitui aconselhamento jurídico e não deve ser invocado nesse sentido. Aconselhamento específico deve ser procurado sobre as circunstâncias concretas do caso. Se tiver alguma dúvida sobre uma questão de direito Português, não hesite em contactar-nos.