A emancipação laboral dos Estafetas através de contratos de trabalho

A 1 de fevereiro de 2024, a primeira sentença do Tribunal do Trabalho de Lisboa, a qual reconheceu um vínculo laboral a um estafeta da UberEats, deu como provado que o estafeta recebia falsos recibos verdes e devia, por isso, ter um contrato de trabalho sem termo com a referida empresa, com efeitos retroativos a 01 de maio de 2023.
Artigos 15/04/2024

Após a entrada em vigor da lei nº 13/2023 em maio de 2023, que trouxe alterações a nível da presunção de contrato de trabalho no âmbito de plataformas digitais com o aditamento do artigo 12º-A ao Código de Trabalho, tinham sido suscitadas algumas questões a este respeito. Uma das principais perguntas prendia-se com a dúvida sobre quais os critérios que, na prática, os tribunais iriam utilizar para considerar a presunção de contrato no âmbito das plataformas digitais.

Relembremos, a este respeito, que o Código do Trabalho após as alterações de 2023, previu como critérios de presunção de contrato de trabalho no âmbito das plataformas digitais os seguintes pontos:

  1. a fixação pela plataforma da retribuição (ou dos seus limites mínimos e máximos) para o trabalho efetuado na plataforma;
  2. o poder de direção exercido pela plataforma digital, a qual determina as regras específicas da prestação da atividade;
  3. o controlo e supervisionamento da prestação da atividade pela plataforma digital;
  4. a diminuição da autonomia pela plataforma digital do prestador da atividade no que diz à organização do seu trabalho, do seu horários das ausências e questões similares;
  5. poderes laborais exercido pela plataforma digital sobre o prestador de atividade;
  6. pertença dos equipamentos e instrumentos de trabalho à plataforma digital:

Surgiu então, a 1 de fevereiro de 2024, a primeira sentença do Tribunal do Trabalho de Lisboa, a qual reconheceu um vínculo laboral a um estafeta da UberEats, dando como provado que o estafeta recebia falsos recibos verdes e devia, por isso, ter um contrato de trabalho sem termo com a referida empresa, com efeitos retroativos a 01 de maio de 2023. Mais tarde, a 19 de março de 2024 veio o Tribunal do Trabalho de Castelo Branco reconhecer o mesmo a quatro estafetas da UberEats. No entanto, enquanto que no primeiro processo a Ré (entidade empregadora) não terá chegado a ser ouvida, no segundo tal já aconteceu. No entanto, ainda assim, o Tribunal não deu razão à entidade empregadora, pois considerou que a UberEats não terá conseguido afastar a presunção de laboralidade, isto é, não conseguiu provar que os estafetas prestavam a sua atividade de forma independente.

Relativamente à prova de contrato de trabalho, no primeiro caso foram confirmados cinco dos seis indícios da existência de contrato de trabalho previstos no artigo 12º A nº 1 da Lei 13/2023, enquanto no segundo bastou a prova somente de três.

As decisões proferidas confirmaram que a prestação de atividade que se desenvolvia no âmbito da plataforma digital, mediante uma aparência de uma prestação de serviços de entrega independente, não era, de todo, independente, comprovando-se que a plataforma digital controlava a atividade do estafeta, restringindo a sua possibilidade aceitar ou recusar tarefas, dentro de um horário estipulado e fixando a retribuição para o trabalho efetuado, tendo por isso a natureza de um contrato de trabalho.

A menos que as empresas se adaptem rapidamente, será legítimo expectar por mais ações propostas nesta matéria, considerando que já foram realizadas 1133 notificações por parte da Autoridade para as Condições do Trabalho e as 861 participações ao Ministério Público para reconhecimento de existência de contrato de trabalho.

Esta nova realidade promove mais segurança e uma situação mais favorável aos trabalhadores abrangidos, sendo que a existência de contrato de trabalho garante mais direitos aos mesmos, nomeadamente, no que concerne a subsídios de férias e Natal, bem como a proibição de despedimento sem justa causa, renumeração mínima, limites do período normal de trabalho e proteção em caso de acidentes de trabalho e doenças profissionais.


O conteúdo desta informação não constitui aconselhamento jurídico e não deve ser invocado nesse sentido. Aconselhamento específico deve ser procurado sobre as circunstâncias concretas do caso. Se tiver alguma dúvida sobre uma questão de direito Português, não hesite em contactar-nos.

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